Tema 1.249 do STJ: uma abordagem didática

1. Divergência Inicial no STJ
A respeito da natureza jurídica das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), havia divergência entre as turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
5ª Turma: Defendia que tais medidas possuíam natureza de medida cautelar penal, voltada a assegurar a eficácia de um processo penal futuro.
6ª Turma: Sustentava que as medidas tinham caráter de tutela inibitória, com índole preventiva e autônoma.
Prevaleceu o entendimento da 6ª Turma, firmando-se que as medidas protetivas possuem natureza jurídica de tutela inibitória, desvinculada de processos penais ou cíveis em curso.
2. Alterações Legislativas: A Lei nº 14.550/2023
A Lei nº 14.550/2023 representou significativo avanço ao incluir os §§ 5º e 6º no artigo 19 da Lei Maria da Penha, consolidando a autonomia e abrangência das medidas protetivas:
§ 5º: As medidas protetivas podem ser concedidas independentemente de tipificação penal, inquérito, ação judicial ou boletim de ocorrência.
§ 6º: As medidas vigoram enquanto persistir o risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da vítima ou de seus dependentes.
Essas mudanças rompem com a visão tradicional de medidas exclusivamente cautelares, reconhecendo seu caráter autônomo e abrangente.
3. Indeterminação de Prazo e Regra "Rebus Sic Stantibus"
Ao contrário das medidas cautelares do processo penal (art. 282 do CPP), as medidas protetivas:
Não possuem prazo previamente definido.
Vigem enquanto persistir a situação de risco, de acordo com a cláusula rebus sic stantibus.
A ausência de um prazo fixo protege a mulher contra a presunção de que o risco cessa automaticamente após determinado período. A análise do contexto fático deve preceder qualquer decisão de revogação.
5. Garantia do Contraditório e da Oitiva da Vítima
A modificação ou revogação das medidas exige:
Oitiva prévia da vítima para garantir sua manifestação sobre a persistência do risco.
Contraditório envolvendo vítima e suposto agressor, de modo a assegurar decisões fundamentadas e justas.
6. Teses Firmadas pelo STJ
Sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ consolidou os seguintes entendimentos:
As medidas protetivas possuem natureza de tutela inibitória e são independentes de boletins de ocorrência, inquéritos ou ações judiciais.
A duração dessas medidas vincula-se à persistência do risco, não havendo prazo predeterminado.
O arquivamento de inquéritos ou a absolvição do acusado não implicam automaticamente a extinção das medidas, dada a possibilidade de continuidade do risco.
Não há obrigação de revisão periódica, mas esta pode ser feita de ofício ou a pedido das partes, mediante análise concreta da situação.